
Fico feliz de ter te encontrado, ainda que após a sua morte. Sinto sua presença a cada poesia, cronica que leio. Deixaste um legado. O olhar suave, a visão crítica, o tom sarcástico, a liberdade métrica dos versos e até mesmo as rimas se encontram e desencontram em sua escrita. Como não me apaixonar pelos seus versos? Pelos seus medos? Por seus anseios...
Estás tão aqui, ao meu lado, apreciando sua boa escrita. Trocamos olhares através das palavras. Olhares de amor, de sofreguidão. De quem esteve no mundo, amou o mundo e buscou entende-lo. De quem via através do próprio homem sua esencia escondida, camuflada pelos vicios mundanos.
Há Drummond, se me desses um tempo. Se me visses como mulher. Se estivesse vivo. Pediria sua mão em casamento. Só para ficar te lendo para o resto da vida.
José
1960 - ANTOLOGIA POÉTICA
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
Amo José!
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